domingo, abril 18, 2004

Sobre a madrugada

Não era hábito, na verdade poderia entrar mesmo no quesito exceção. E assim, lá estava, corpo jogado, sozinha, contemplando o que se apresentava à sua frente. Vez por outra mudava as cenas, mas tão rápido que mal conseguia assimilar. Ia, mas voltava, sempre ao mesmo lugar.

A mente não estava lá. Não parava de pensar naquele que, depois de muitas semanas, dera notícias. Notícias? Só mesmo alguém como ela para considerar notícias um fundo branco onde se lia a palavra saudade, solitária. "Em caixa alta", gosta de ressaltar, já que para ela isso também tem significado.

De volta às cenas, ainda observava e formulava suas inevitáveis perguntas. Observava os detalhes e tentava guardar no já abarrotado pote de "assuntos a discutir". Os assuntos se sucedem à sua frente numa crescente. Até que um nome lhe desperta atenção, uma música e a madrugada começa a mudar. Suas mais antigas lembranças vêm à tona.

Agora, com toda atenção voltada para o assunto que muito lhe interessava, sua postura mudara. Absorvia tudo o que era dito, tanto que foi capaz de adivinhar o que viria a seguir.

Olhos vidrados, ouvidos atentos, ele surgia bem ali, na sua frente. Contou uma história, mas ela nem ouviu bem. Distraída olhava o jeito dele, o sorriso, a barba... "Ele está de barba! Prefiro o cavanhaque 1000 vezes!", deixou escapar sem sentir. Nos detalhes do rosto, percebeu sinais de cansaço, parecia mais velho, culpa da tal barba, talvez. "Estava mais bonito deitado ao meu lado sorrindo e dizendo 'você veio!'", ela mesma concluiu.

E a cena seguiu, por eternos poucos minutos. Ouvia a voz dele na música que pertencia aos pais dela, uma música que inúmeras vezes embalou seu ninar. As mãos trêmulas do rapaz denunciavam seu envolvimento com o momento. Ficou feliz por ele, sabia bem o quanto era bom realizar sonhos. Ficou feliz por ela mesma, ele mostrou sem querer que não era mais um canalha em tempo integral. "Como foi bom beijar esse cara!", exclamou meio a um sorriso.

Nenhum comentário: